Desabafo - A Esperança Guardada em uma Caixa de Bala de Goma
- Juçara de Souza
- 1 de jun. de 2016
- 3 min de leitura

Todas as segundas feiras vou ao centro resolver mil coisas... Como moro no Sul da Ilha e trabalho aqui mesmo, não tenho a necessidade de ir sempre. Faço uma lista dos meus afazeres e sigo. O centro da cidade após uma hora que chego, mais ou menos, perturba muito minha cabeça, as pessoas correndo, a falta de educação e gentileza, a forma como o ser humano é umbilical, os carros, a quantidade de gente que vive na rua, seja criança, idoso, viciado, mal amados, desprezados de todos os gêneros, até mesmo aqueles que se desprezam. Isso confesso que me causa uma compaixão e aperto no coração. Fico cada vez mais, avaliando minha própria vida. Tudo que vivi e adquiri nesses meus 53 anos, com muito ou pouco esforço. Minha casa, minhas filhas, os cachorros que já tive, minhas gatas, meus pais, (um já se foi) , a relação que eu tive com tudo isso até hoje e onde carrego minhas esperanças. Tudo que ouvi, tudo que li, que aprendi ao longo da minha vida, que juntando tudo, fez essa pessoa que sou hoje e sigo com minha construção pessoal. Seguindo eu na segunda feira, já havia passado a primeira hora no centro da cidade e eu com a cabeça um tanto perturbada. Carros, homens, crianças, igreja, lojas, lixo, bares, restaurantes, auto falante e derrepente surge um rapaz jovem e me diz: Moça eu não vou pedir dinheiro, não sou marginal e também não sou daqui, a senhora... Ele falava muito rápido como se eu fosse interromper a qualquer momento, pq precisava ser ouvido. Eu o interrompi e disse: Meu querido, eu não estou dizendo nada disso, quem está falando é vc. Não seria mais fácil vc me dizer o que realmente quer? Então ele falou: É que eu já fui maltratado agora pouco, sem eu fazer nada e eu só preciso que me escutem. Naquele momento era de suma importância o que ele queria e lhe ia ajudar muito. Eu disse: Então fale. Ele tirou uma nota de cinco reais do bouço e me disse: Eu tenho 5 reais e queria muito, mas muito mesmo, comprar uma caixa de bala de goma, para vender na rodoviária, não sou daqui e estou dormindo em um albergue, hoje uma senhora pagou um banho pra mim ( Ele realmente estava limpo), se eu comprar e vender, posso comprar outra e continuar vendendo, sem ter que pedir dinheiro pra ninguém. Ele seguiu ... Eu pedi para o moço da loja vender por 5 reais e ele correu comigo. Detalhe, a caixa que o garoto queria custava 8,50 reais. Então entrei na loja e comprei a caixa encantada de balas de goma, que no momento era a gota de esperança que ele tinha, um ser solitário de 21 anos, chegou na cidade em busca de outra vida. Vivia no interior do RS com seu pai alcoólatra, tinha as mãos calejadas da ferramenta de trabalho. Ele não tinha marcas escuras nos dedos, nem de drogas e nem de cigarro, tão pouco tinha cheiro de álcool, seus olhos ainda carregavam um brilho de esperança misturado com uma tristeza profunda. Quando eu perguntei sobre sua família, ele começou a chorar com uma certa vergonha. Nesse momento meu coração já estava completamente destruído, então eu dei um abraço bem forte nele e ele se foi, secando as lágrimas com a manga da camiseta. Fiquei uns minutos olhando pra ele caminhando e eu em prantos. A garota que vendia pipoca na rua, havia acompanhado tudo, me olhou com ar de tristeza também Naquele momento de fragilidade emocional, lembrei de uma parte de um texto meu que diz: Feliz daquele, que com a dor alheia se compadece e mesmo assim não se entristece, segue assim sendo feliz ... Tentei me agarrar nisso para terminar minha segunda feira, depois de ser tocada profundamente por aquele garoto. Me agarrei também na esperança, que aquele garoto de 21 anos, carregava na sua caixa de Balas de Goma. Ele, apesar da tristeza, ainda carrega um lindo brilho em seu olhar, que eu nunca mais vou esquecer. E se ele pensa que eu o ajudei, está enganado, quem foi ajudada fui eu.
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