Um Violino, um Conhaque e meu Pai
- Paulo Cesar Cabral Bossle
- 6 de mai. de 2015
- 2 min de leitura
Era pequeno ainda, mas conseguia enxergar o carinho e o tempo que meu pai dedicava ao seu violino. Autodidata, ele era de uma família de músicos. Alguns com talento outros nem tanto. Ach que ele era do segundo grupo. Treinava todas as noites que me lembro. Quando ia trabalhar, a curiosidade de criança me dirigia ao estojo preto. Retirava com cuidado o violino e de forma insistente, fazia soar um ganido daquele instrumento tão curioso. Um dia meu pai me flagrou com a mão na massa e, após a punição, sempre branda, falou que o violino era muito valioso e que valeria uma fortuna no futuro. Passei a olhar o violino com um olhar brilhante e cheio de expectativas. As cerdas eram de crina de cavalo. Tinha uma cera que era passada naquelas cordas esganiçadas que com o uso deixavam um pó branco em sua madeira envernizada, aumentando ainda mais seu valor. Fiquei com aquilo na mente e nem por isso deixei de "tocar" aquele grunhido horroroso na sua ausência, contrariando suas ordens. Em outra ocasião, meu pai chegou em casa todo orgulhoso, pois um amigo o tinha presenteado com um conhaque. Falou para todos que quanto mais velho, mais valioso o conhaque ficaria. O violino e o conhaque acompanharam todas as nossas mudanças com status diferenciado. Com sua morte, minhas irmãs resolveram vender o violino, na expectativa de conseguir um bom valor. Foi vendido por uma ninharia, pois o violino valia menos que um novo. Afinal não era um Stradivarius. Ele morreu sem saber que o violino deixado, apesar do tempo, não tinha valor e que o conhaque, que ele não tomou, estava estragado.. Ainda bem, pois eram seus sonhos e me ajudaram a entender um pouco meu pai.

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