Aniversário
- Anamaria Kovács
- 6 de mai. de 2015
- 2 min de leitura

Se vivo fosse, meu pai, Tibor Kovács, completaria hoje cento e dez anos de idade. Quando chegou a este mundo, numa cidadezinha da Hungria, seu país natal era parte do Império Austro-Húngaro, cujo governante seria assassinado em 1914, acendendo o estopim da Primeira Guerra Mundial. Em Budapeste, para onde a família se mudou e de onde emigrou, anos mais tarde, para Viena, trafegavam, naqueles tempos, fiacres, tílburis e bondes puxados por burros ou cavalos. Luz elétrica era uma raridade; as ruas eram iluminadas a gás, assim como no Rio de Janeiro, onde meu pai aportou, aos 21 anos de idade, e de onde só saiu, por receio da violência, no ocaso da vida.
O mundo que ele encontrou, em 1905, nada tem a ver com o que deixou em 1980. Durante sua passagem por aqui, além das duas guerras mundiais que o dividiram em dois pólos opostos, não houve um dia sequer de paz. Por outro lado, descobertas revolucionárias melhoraram o padrão de vida de milhões de pessoas, enquanto outros milhões, vítimas da injustiça e da desigualdade, afundavam cada vez mais na miséria e na doença. Meu pai viu surgir e desenvolver-se a aviação, a conquista do espaço, e centenas de aparelhos que hoje fazem parte do nosso cotidiano; ficaria fascinado pelo computador, cujos primeiros passos testemunhou, como engenheiro.
Fico imaginando, porém, a decepção que sentiria diante da falta de sensibilidade das pessoas, da corrupção, da violência doméstica e urbana, da desvalorização da vida em favor do dinheiro e do descaso diante da poluição e da destruição do meio-ambiente. Talvez tenha sido melhor, para ele, deixar o mundo em 1980...
A crônica original foi publicada no Jornal de Santa Catarina em 28/04/2005, por ocasião do centenário de meu pai.
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